Thursday, July 24, 2008

Sejam bem vindos os que vêm de boa vontade


O caminho era, na verdade um corredor, o chão de terra batida e as paredes pareciam feitas de pedra escava, como em uma mina. Sentia a brisa leve e fria batendo no meu rosto em lufadas regulares, como se fosse a respiração de alguém, mas uma respiração fria demais para ser alguém vivo. A luz emanava de algum ponto à diante. Era fraca, tênue e não me permitia ver muitos detalhas. Na verdade, mais parecia a luz que atrai os insetos para a morte. Bruxuleante e azulada, ela se intensificava à cada passo meu. Ouvia os ruídos que meus pés faziam no solo como se fossem fazer sangrar meus ouvidos. Nada mais fora meus passos e minha respiração podiam ser ouvido. O ar carregava uma tensão que poderia explodir meu crânio, mas eu agüentava. Mais um passo e outro. Minhas pernas titubeando. Agora eu já sentia medo. As lufadas leves estavam mais frias. A luz mais forte. Eu agora tinha certeza que estava entrando em uma caverna escavada, nada natural.

Uma curva no caminho me fez parar. Agora eu também ouvia meu coração. Ele batia tão forte que por um segundo eu o ouvi reverberando nas paredes de pedra da caverna. O que viria depois da curva eu não podia imaginar, mas minhas pernas, à despeito das ordens expressas do meu cérebro, resolveram continuar.

Um grande salão de pedra escavada se abriu diante dos meus olhos. O cômodo era de forma oval e iluminado por uma luz feérica que emanava de um grande cristal azulado. Fiquei atônita olhando para a pedra encravada no chão e não percebi que por trás dela havia alguém. Despertei com uma voz feminina limpa e clara. "Você demorou. Eu a estou esperando há alguns dias". "Me esperando? Eu estou sonhando, você não existe, esta caverna não existe e em pouco tempo eu estarei acordada, rindo disto tudo". A resposta que eu havia dado traduzia minha crença  estúpida de que iria sair ilesa daquilo. Ela continuou. "Claro, você me chamou. Faz dias que me invoca, mas não aparece. Hoje, eu tive que buscá-la. Você terá que se decidir agora".

Parei alguns segundos e observei a figura à minha frente. Deveria ter por volta de 1,40m de altura. A pele pálida destacava ainda mais seus cabelos negro-azulados. Suas sobrancelhas partiam do cenho até, praticamente, encostarem  na raiz dos cabelos. Também muito negras, emolduravam olhos amendoados e de um verde profundo. Escuro como esmeraldas reluzentes. O nariz parecia ter sido esculpido com suaves cinzeladas em mármore branco e os lábios tinham contornos delicados. A voz que saía deles, porém, era forte e apesar do corpo esguio e frágil, sua presença era intimidadora. Ela rodeou o cristal no chão e me encarou de frente. Me olhava de baixo para cima. Estava vestida como se tivesse caído em um cesto de roupas recém lavadas. Peças sem nenhuma combinação, mas com muitos brilhos, se encontravam sobre os ombros e encobriam, parcialmente, seu corpo. Continuei parada, talvez mais tempo do que deveria, pois não lembro em nenhum momento de ter aceitado a proposta quando ela ergueu as mãos fazendo a luz ficar muito forte.

"Este é o portal de Arcádia, esta é a passagem para os outros mundos, eu sou sua guardiã e vigilante. Ao movimento de minhas mãos obedeça! Portão, abra". A voz ecoou pelas paredes, encheu o ambiente, entrou nos meus ouvidos e nublou minha visão. O chão tremia e reverberava o poder das afirmações. Meu coração agora batia de acordo com aquele tom e minhas pernas pareciam ter deixado de existir. O clarão me cegou completamente.

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Aos desavisados tenham cuidado onde pisam este é o meu mundo.
Hoje, os lobos correm, suas presas rangem e o sangue cheira, embotando o pensamento.
A Lua é cheia e os uivos cortam o ar. Liberem suas emoções e experimentem o mais puro prazer provocado pelo instinto.
Encontrem seu lugar e divirtam-se. Sejam bem vindos!

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